BICHO SOLIDÃO
Bicho
solidão
27.10.2012
Arquimedes Estrázulas
Pires
Nas observações que tenho feito
durante palestras e conversas que esparramo por aí, tenho conhecido pessoas,
situações e conflitos bastante diferentes entre si, mas, na essência,
absolutamente semelhantes. Dentre eles, um dos mais interessantes é o do ser
só.
Há o
indivíduo que vive, come, bebe, chora, ri, fala, ora, dorme, viaja, trabalha,
estuda e, independente de quanta gente haja à sua volta está sempre... só. Há
aquele que se sente só em todos os lugares e em todas as circunstâncias, e há
aquele que se sente só apenas em situações particulares. Dentre este grupo há os
que se sentem muito bem em companhia de outras pessoas no trabalho, na rua, na
igreja, na universidade... Mas quando chega à casa, no fim do dia, tudo se
passa como se as portas do mundo se houvessem fechado atrás de si e, nesse
ambiente onde tudo deveria convidar ao relaxamento, à descontração, à liberdade
de sentir e manifestar, comentar e desabafar, rir e galhofar, sente-se sombria
e pesadamente... só!
Deste grupo
ainda é possível extrair situações em que a solidão se torna exponencial e de
uma forma medonha, quando o só é pessoa de lides coletivas habituais, não raro
um chefe de grandes grupos profissionais, um professor ou um líder religioso.
Muito mais comum do que se imagina!
Neste caso
a solidão se manifesta de diferentes maneiras, mas sempre no regaço doméstico,
onde a água deveria ser sempre fresca, a sombra sobeja e a paz possível e presente.
Nem sempre é assim.
Não é difícil
- entre estas - encontrar pessoas que se dedicam ao compartilhamento do
conhecimento, à construção do caráter, à produção de bons exemplos e à
orientação a outrem, no sentido dos caminhos que a dignidade recomenda. E,
também, pessoas de índole, caráter e compromisso filosófico religioso de tal
modo presente, que difícil mesmo seria imaginá-las com problemas desse naipe.
Mas, por
que isso acontece?
Normalmente
esse sentimento de “estar só” ocorre quando os familiares desse indivíduo
vibram em uma faixa diferente da sua. Significa dizer que, se o nível de
conhecimento entre marido e mulher é significativamente diferente, se cada
membro da família tem uma opção religiosa diferente da dele, se algum “acidente
de percurso” ocorreu e em dado momento da viagem esse indivíduo perdeu o
comando da casa e da rotina aí estabelecida, é bem possível que haja
dificuldade no relacionamento entre todos, daí em diante, porque de líder
familiar ele terá passado a apenas membro da família; nem sempre admirado. E
onde não há admiração não perdura o amor, o respeito e a liberdade de
expressão, manifestação e vontade. Isso vale para o líder familiar homem e para
a líder familiar mulher; não há uma barreira que divida os dois territórios.
O grande
problema, em tais casos, é onde buscar aquele ombro que de vez em quando faz
falta para o desabafo, para o comentário das ocorrências do dia, para a
manifestação deste ou daquele anseio, ou para a libertação daquela angústia que
está judiando. Buscar a um colega de trabalho, a um líder religioso, a um amigo
da família, a um psicólogo, psicanalista...?
Nem sempre é
possível, porque se o assunto é estranho ao ambiente de trabalho, por exemplo,
um colega daí, de pouco ou nada servirá para aconselhar ou ouvir. Os líderes
religiosos – não raro! – são pessoas cujos ombros estão sempre carregados dos
problemas que lhes chegam diariamente, e que nem sempre têm onde descarregar, de
vez em quando, os seus próprios. Eles também não têm fórmulas prontas e nem
sempre podem ser eficazes nas orientações que dão. Não que não o façam com
dedicação, mas porque os orientados nem sempre estão decididos a ouvir e
praticar. Os amigos da família, por envolvimento óbvio, nem sempre são os
melhores conselheiros. Até porque, apoiar um lado pode significar desequilibrar
o todo, e assim por diante. Um profissional do psiquismo? Nem sempre há
disponibilidade financeira para tanto.
Mas então,
como é que fica? Simplesmente não fica?!
Albert
Einstein diz que “no meio da dificuldade encontra-se a oportunidade”. Partindo
desse princípio – verdadeiro, aliás! – podemos garantir que a grande saída é a
reforma íntima; como quem reforma uma casa!
E nenhuma
boa reforma preserva tudo o que há; é absolutamente normal que tinta velha e
desbotada, reboco deteriorado, fiação elétrica estragada, tubulação gasta e até
paredes e pisos sejam arrancados, quebrados, estourados e jogados fora, pra que
uma nova estrutura, uma parede bonita, instalações adequadas, e uma pintura
estimulante permitam que nos sintamos bem, dentro da casa onde moramos.
“O meu corpo é o templo do meu Espírito”, diz
Paulo, o Apóstolo. Portanto, que eu me reforme! O Espírito que sou, precisa se
sentir bem, dentro dos conceitos que passarei a ter depois da reforma que fizer
em mim mesmo. E, em relação à vida e à minha natureza divina, agora devo me ver
perfeitamente encaixado. Porque sou parte do Todo; sou partícula de Deus.
Reformar-se
intimamente, portanto, implica jogar fora velhos conceitos, amassar e incinerar
rancores e mágoas, picar e colocar na lata do lixo existencial o ódio, a
inveja, os apegos, os desejos de vingança, a hipocrisia, a mesquinhez, a
presunção de poder, a vaidade exacerbada, a luxúria, a prepotência, o egoísmo,
o orgulho, os complexos em geral e, arrematando tudo isso, incorporar como
norma de bem viver, a humildade, o perdão, a nobreza de sentimentos, o respeito
incondicional ao Criador de Todos os Mundos e, evidentemente, o amor ao próximo
e a caridade.
Esse é o
processo e é essa a fórmula para a vida em harmonia, em equilíbrio e em paz. Se
a tal felicidade duradoura é imaginada possível, jamais o será sem que tenhamos
nos transformado através desse processo doloroso de modificar hábitos,
costumes, conceitos e jeito de ser.
Reforme-se,
portanto! Não é nada fácil; mas você consegue!
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