O Grito e o Eco
30.04.2014
Arquimedes Estrázulas
Pires
A graça está exatamente na
surpresa que Deus coloca logo depois de cada curva da estrada por onde a vida
viaja. Em cada uma está implícita a avaliação que recebemos pelo desempenho até
aí. Se desagradáveis, mostram que faltou empenho na caminhada. Boas surpresas
mostram que estamos indo bem. Isso deve nos orientar sobre o que vale e o que
não vale a pena fazer ou repetir durante a marcha.
Com o tempo de viagem a gente
acaba percebendo que os bons acontecimentos não são privilégios e que as coisas
azedas não são tragédias ou castigos, mas efeitos de causas que produzimos
alhures.
Em “Transtornos
Psiquiátricos e Obsessivos”, obra psicografada por Divaldo Pereira Franco, Manoel
Philomeno de Miranda diz que “somos
herdeiros de nós mesmos”.
E explica: “o Espírito transfere de uma para outra etapa as conquistas e os
prejuízos de que se faz possuidor, sendo-lhe impostos os deveres da
reabilitação e do refazimento quando erra, tanto quanto do progresso quando se
porta com equilíbrio. Mesmo quando sob a ocorrência das provas e expiações,
encontra-se em processo de crescimento interior e na busca da meta iluminativa,
que é a fatalidade da qual ninguém consegue evadir-se”.
Mas só bem depois que tudo estiver
totalmente digerido, compreendido, assimilado e integrado ao “eu maior”[1] é que a pessoa percebe que
a aceitação de tudo se traduz em paz e Luz. Poucas coisas lhe perturbam a paz,
então, e muito poucas lhe empurram para a penumbra da desesperança e da
tristeza. Porque é tudo lógico, na obra de Deus.
É então que o Espírito humano
entra em comunhão consigo mesmo e com o Cosmo. E compreende que não é fruto do
acaso.
A etapa seguinte é o trânsito
direto para os primeiros degraus da sabedoria. É quando passamos a misturar –
sem pressa - o conhecimento adquirido na experiência nem sempre alegre, com a
nobreza de sentimentos adquiridos na persistência diária das reencarnações
sucessivas; como a humildade, a serenidade, a resignação, a caridade e o Amor.
Este último em sua forma incondicional. Porque somos partículas da própria
Inteligência Universal, a quem chamamos Deus.
A partir de então, o ser encarnado
já não se importa com os trechos eventualmente íngremes – ou de qualquer modo
difíceis - das estradas que viaja na matéria; porque se reconhece responsável
por todo o bem e por todo o mal que aqui e ali possam lhe assaltar. E sabe dos
meios mais adequados de usufruir o primeiro e livrar-se do segundo.
Em resumo, a cada nova experiência
– não importa de que natureza seja – nos elevamos um pouco mais na escala do
conhecimento; ou retardamos a marcha. O Espírito humano
estaciona em sua escalada evolutiva, se quiser, mas não regride jamais, nos
ensinam os bons espíritos através da obra de Kardec, o Codificador.
O conhecimento e a experiência são
ingredientes indispensáveis para o sentimento eventual que catalogamos como
felicidade. Eventual, porque é sempre efêmero. Houvesse felicidade perene nos
níveis evolutivos em que vimos reencarnando ao longo de alguns milênios, e
certamente viveríamos não mais em um planeta de expiação e provas, mas em outro
de destinação muito superior. O que ainda não é o caso deste maravilhoso
Planeta Azul.
Assim, conhecidos o grito e o eco
- pra usar uma metáfora bem sugestiva - sabemos que se não soltarmos o
primeiro, não ouviremos o segundo. Elementar. Isso nos remete à noção exata de
quem somos os artífices da própria corda que usamos na escalada. Como,
portanto, reclamar das falhas deixadas enquanto a tecemos?
O mérito é tão maior quanto maior
for o dispêndio de energia, paciência e resignação em cada concessão que nos
permitimos em favor de nós mesmos. De nada adiantam a impaciência e a
desesperança, se é depois da próxima curva que está a nossa “Caixa de Pandora”. Não há como prever
como será o daqui a pouco. Deus, a Inteligência Maior, é perfeito em toda a Sua
obra. Soubéssemos antecipadamente sobre o sucesso ou o infortúnio, e a imperfeição
humana poderia nos impelir à arrogância ou ao desespero. Sentimentos que em
nada nos seriam de alguma utilidade.
Confiar na Providência Divina é a
grande pedida. E se sabemos que só recebemos daquilo que distribuímos, é
inteligente ouvir a própria consciência antes de gritar entusiasmos, angústias,
anseios e sonhos. Só haverá um eco agradável se o grito tiver a mesma natureza
em nós.
*** ***
***
Comentários